A prefeitura municipal de Bento Gonçalves deixou de arrecadar mais de R$ 4 milhões desde o início do ano até o mês de agosto com as infrações cometidas na área de zona azul na cidade. O motivo seria a falta de agentes de trânsito para realizar a fiscalização das tarifas aplicadas pela Rek Parking, empresa terceirizada pela prefeitura para fazer o controle das vagas de Zona Azul.

O valor é referente apenas a 2016. Ao longo do ano, a empresa registrou mais de 43.500 Tarifas de Pós-Utilização (TPUs) desde o dia 1º de janeiro até o dia 23 de agosto. Essas tarifas são aplicadas para condutores que utilizam o espaço destinado às vagas de Zona Azul de maneira incorreta.

No entanto, entre janeiro e junho, foram registrados pouco mais de mil Autos de Infração de Trânsito referentes à utilização incorreta do estacionamento rotativo. A Secretaria de Gestão Integrada e Mobilidade Urbana ainda não tem os números de multas registradas nos meses de julho e agosto pois ainda é preciso esperar a homologação do Detran referente às infrações mais recentes.

Para entender o valor, é preciso fazer uma série de contas. De acordo com o supervisor regional da Rek Parking, José Airton Martins, até a data citada, foram exatamente 43.569 TPUs feitas pelos 15 monitores da Rek Parking. Dentre essas, cerca de 22% são regularizadas diretamente com a empresa, antes das 48 horas previstas para o encaminhamento ao Departamento de Mobilidade Urbana (DMU), onde é gerado o Auto de Infração de Trânsito (AIT).

O DMU, portanto, recebeu quase 34 mil infrações ao longo de 2016. O que representa, em média, 4250 infrações por mês – e mais de 190 por dia, levando em conta que apenas em 22 há o funcionamento da Zona Azul. Ao descontar os Autos de Infração de Trânsito feitos pelo DMU, sobram cerca de 4 mil infrações que não são registradas por mês. Ao multiplicar o valor por R$ 127,69 (custo da multa por infração grave), chega-se ao montante de R$ 508 mil ao mês e, portanto, mais de R$ 4 milhões se multiplicados pelos oito meses do ano – vale lembrar, ainda, que a partir de novembro o valor de todas as multas sofrerão reajustes, e a infração grave passará a ser de R$ 195,23 (reajuste de 52%).

Secretaria de Mobilidade Urbana contesta valores

Procurado pela reportagem para esclarecer o valor, o secretário de Gestão Integrada e Mobilidade Urbana, Vanderlei Mesquita, afirmou que os números não procedem. Segundo ele, é impossível projetar o número, mesmo que todas essas TPUs sejam feitas de fato pela Rek Parking. “Mesmo que eu tivesse 100 agentes, não conseguiríamos fazer todas essas AITs”, afirmou.

Segundo ele, o valor de R$ 4 milhões não é arrecadado em multas durante todo o ano. “Mesmo que eu colocasse todos os agentes de trânsito para fazer isso, e mais a Brigada Militar, seria impossível gerar tantas AITs. Até porque a rotatividade é muito grande, os carros não ficam na vaga. É o mesmo que achar que a Polícia vai prender todos os que cometem outros delitos”, destacou.

Questionado sobre o número de mais de 43 mil Tarifas de Pós Utilização feitas pela Rek Parking até a data citada, Mesquita também contestou o número, e afirmou que deverá pedir uma auditoria para confirmação da quantidade de TPUs feitas.

De acordo com ele, o valor total arrecadado em multas de todos os tipos de infração ao longo do ano não chega a 25% disso, ou seja, R$ 1 milhão. “É preciso diferenciar o que é efetivado é o que é possível de ser realizável, que está muito longe do total”, frisou  o secretário.

Segundo Mesquita, o principal problema ainda é o número baixo de agentes voltados para confirmar a infração. O agente do DMU possui um aparelho semelhante a um celular, interligado diretamente com o Personal Digital Assistant (PDA, uma espécie de agenda eletrônica sem teclado) do fiscal da Rek Parking. Para a confecção do Auto de Infração de Trânsito, é necessária uma foto que comprove a irregularidade. “Os nossos agentes não conseguem fazer todas, porque estão sempre girando”, salientou. O número de agentes também é menor do que os da empresa privada.

Uma das soluções seria a efetivação de pessoal. O concurso, já realizado, prevê em edital a contratação de cinco novos agentes, com possibilidade de outros cinco também serem chamados. No entanto, por se tratar de ano eleitoral, Mesquita afirmou que é necessário cautela. “A intenção é chamar até o final de outubro. Mais tardar até janeiro. Se não houvesse eleição, já teríamos convocado”, garantiu. A previsão é que, depois de chamados, os agentes possam estar na rua em três meses. 

“TPUs geradas ainda são poucas”

Para a Rek Parking, no entanto, o número de Tarifas de Pós Utilização (TPUs) efetuadas ainda é baixo. Pelo menos essa é a avaliação do supervisor regional da empresa, José Airton Martins. Segundo ele, a fiscalização em Bento Gonçalves por parte dos monitores da empresa ainda está longe do ideal. “O nosso maior problema é de fiscalização, tanto nosso quanto da prefeitura. Ela é precária. Ter mais agentes ajudaria”, comenta.

Além disso, na opinião de Martins, os usuários da Zona Azul em Bento ainda têm dificuldades em efetuar o pagamento das TPUs geradas. De acordo com ele, é uma das cidades com maior número de inadimplência entre os municípios no qual a Rek Parking atua junto com as prefeituras. “Em Gramado, por exemplo, o pessoal paga bem mais. Mas temos que levar em conta que o turismo é maior”, pondera.

No entanto, a principal reclamação de Martins diz respeito a falta de utilização correta do ticket da Zona Azul. “Se todo mundo tirasse o ticket, não teríamos que ter que regularizar TPUs. Não tem motivos para isso não ser feito. Os fiscais estão sempre circulando, e as máquinas espalhadas pelo centro estão funcionando”, destaca o supervisor.
O secretário de mobilidade urbana Vanderlei Mesquita concorda. Segundo ele, o ideal seria que as pessoas entendessem que a utilização do ticket é importante. “Ninguém gosta de bater recorde de arrecadação por infração de trânsito. Precisamos de um trânsito mais educado”, comentou.

Mesquita lembra, ainda, que em setembro Bento Gonçalves deve realizar a maior campanha de conscientização de trânsito de sua história, para a Semana Nacional de Trânsito, que ocorre entre os dias 18 a 25 de setembro. O objetivo, de acordo com ele, é educar e conscientizar os condutores a respeito da importância de ter cuidados no trânsito. O evento deve contar com o apoio de diversas entidades e organizações de segurança pública e de demais setores de Bento Gonçalves.

Consepro diz que lamenta números

Para a Fundação Consepro de Apoio à Segurança Pública de Bento Gonçalves, a perda chegaria a R$ 108 mil por ano, conforme explica o presidente do Consepro, Geraldo Leite. Parte da arrecadação é destinada ao órgão, que aplica a verba no setor de segurança pública do município, apoiando as organizações do setor.

O presidente lamentou que tantas TPUs não retornem na forma de AITs e o município arrecade menos do que poderia, mas isentou o DMU da responsabilidade. De acordo com ele, o principal entrave é a falta de pessoal para fazer com que a Zona Azul funcione de fato. De acordo com ele, a demanda e o tamanho da cidade exigem isso. “Só tem uma forma de dar certo, que é com fiscalização. Sem isso, não funciona. Tanto em monitores quanto em agentes de trânsito. Mas não é falha do DMU. Precisa de mais pessoal”, ressaltou ele.

Segundo o presidente, a arrecadação global do Consepro, somando as doações da comunidade e também o que é destinado por meio dos convênios com o Ministério Público, Poder Judiciário e a Zona Azul, foi de R$ 750 mil em 2014. Desse montante, R$ 288 mil provenientes da Zona Azul. O investimento em segurança pública chegou a R$ 727 mil no ano.
Em 2015, o valor recebido pelo Consepro foi de R$ 662 mil, sendo da Zona Azul R$ 293 mil. Em 2016, até o mês de junho, foram R$ 226 mil, sendo R$ 138 mil provenientes da Zona Azul. O aporte em segurança pública feito entre o período é superior a R$ 700 mil.

 

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