Normalmente associado a blocos, marchinhas, festas, desfiles e fantasias, o feriado de carnaval tem outro fim em Bento Gonçalves: a colheita da uva. Os turistas que procuram mais tranquilidade nestes quatro dias que vêm pela frente, normalmente lotavam os leitos dos hotéis no município. Entretanto, em 2017, o quadro mudou. De acordo com o Sindicato Empresarial de Gastronomia e Hotelaria (SEGH) Região Uva e Vinho, neste ano a ocupação média deve chegar próxima a 75%.

Conforme o presidente da entidade, João Antonio Leidens, a crise econômica é a responsável pela abaixa procura. “A ocupação é a menor dos últimos anos. Bento não é uma ilha. O momento econômico difícil do Brasil tem impactado muito o setor hoteleiro”, avalia.

Os mesmos dados são compartilhados pela gerente geral do hotel Vinocap, Soraia Lima da Veiga. Segundo ela, apesar da manutenção ou até a queda do valor das diárias, a taxa de ocupação ainda é baixa. “Os principais dias são sábado e domingo. Na terça a taxa já cai para menos de 25%. Essa diminuição na quantidade de hóspedes ocorre desde o último ano. Apesar dos feriados prolongados desse ano, a perspectiva não é boa”, descreve.

O diretor-superintendente da rede de hotéis Dall’Onder, Tarcísio Michelon, vai ainda mais longe. Ele classifica um “crime” a divulgação de dados relativos especificamente aos dias de carnaval. “Temos que levar em conta uma semana antes e uma depois do feriado para vermos a real situação dos nossos hotéis. Se formos medir dessa forma, a ocupação não chega a 35% em média”, critica.

Bons números no Vale dos Vinhedos

Além da tranquilidade, a vindima é a principal atração do turismo bento-gonçalvense para o período. A programação de cada hotel é bastante variada e inclui desde a colheita e pisa das uvas até guerra de bexiguinhas. Outra atração do final de semana é a festa da Cuccagna, que ocorre hoje, 25, na comunidade 40 da Leopoldina.

A ligação dos eventos ao Vale dos Vinhedos pode explicar o motivo do o hotel Villa Michelon, localizado na comunidade do 8 da Graciema, ter se tornado um oásis em meio à baixa procura aos hotéis. De acordo com o gerente operacional do empreendimento, Leandro Giordani, a ocupação para o período é de 100% nos quatro dias.

Ele ainda afirma que a procura foi tão alta que, caso o hotel tivesse o dobro dos atuais 150 leitos, o Villa Michelon ainda estaria lotado. “O brasileiro deixa tudo para a última hora. Tivemos que negar muitas hospedagens porque já estávamos com a casa cheia”, lembra.

O secretário de turismo do município, Gilberto Durante, também considera a ocupação satisfatória. Ele cita um caso em particular para demonstrar a alta procura por leitos no município. “O prefeito de Gramado, João Alfredo Castilhos Bertolucci, me ligou essa semana pedindo ajuda. Ele vem para cá no carnaval com a família e estava tendo dificuldade para encontrar um quarto”, comenta.

Setor hoteleiro prevê crise com o aumento dos leitos

Com alguns hotéis em construção no município, Bento Gonçalves deve receber cerca de 1,5 mil novos leitos em, no máximo, dois anos. O número representa um acréscimo de 40,5% na quantidade atual, que é de 3,7 mil. A ampliação da oferta a um setor que já sofre com a baixa procura no último ano, tem causado dor de cabeça aos empreendimentos que já estão no mercado.

O diretor-superintendente da rede de hotéis Dall’Onder, Tarcísio Michelon, contesta os números positivos divulgados pelo poder púbico e afirma que a publicação destes dados pela imprensa gera uma falsa euforia, atraindo novos investimentos. “A Secretaria de Turismo tem divulgado que o número de turistas tem crescido todos os anos. Mas temos que levar em consideração que apenas 50% daqueles que chegam a Bento, ficam uma noite pelo menos. A verdade é que a grande parte do mercado está mal”, revela.

O efeito da queda no número de hóspedes já causa efeitos também no hotel Vinocap. Segundo a gerente geral, Soraia Lima da Veiga, desde o ano passado a empresa não tem reposto os funcionários que se desligam. “Se continuarmos com essa baixa, teremos que começar a reduzir o número de funcionários”, avalia. “Nosso custo fixo é muito alto. O que gastamos com 10 ou 100 clientes não é muito diferente. Temos que cortar sem afetar o serviço”, completa.

O presidente da SEGH Uva e Vinho, João Antonio Leidens, ainda cita outras alternativas de hospedagem, como o Airbnb, como concorrência desleal. Pelo aplicativo é possível disponibilizar um quarto em qualquer residência para aluguel. Já são mais de 50 hospedagens disponíveis no município, apenas pela ferramenta. “Para a hotelaria, o momento requer políticas de incentivo a inovação e a novos atrativos, além da contínua promoção do destino Bento a nível nacional”, define.

Leia mais na edição impressa do Jornal Semanário deste sábado, dia 25 de fevereiro de 2017.