A cada mês, três pessoas são infectadas com o vírus HIV e contraem a doença da Aids em Bento Gonçalves, segundo o último dado de 2015 disponibilizado pela Vigilância Epidemiológica do município. Desde 1986 foram registrados 478 casos, sendo 72,7% em homens e 27,3% em mulheres. O tratamento é feito com um composto de remédios, antes denominado como coquetel, que é oferecido pelo Sistema Único de Saúden (SUS) e que, há quase seis dias está em falta na Capital do Vinho.

A enfermeira responsável pelo Serviço de Atendimento Especializado e Centro de Testagem e Aconselhamento (SAE/CTA) de Bento Gonçalves, Adriana Cirolini, afirma que há mais de 200 pacientes que esperam pelos comprimidos, mas que o problema da falta de remédios está diretamente ligada ao atraso do Governo Federal. “Não recebemos nota oficial sobre o caso, mas segundo o que nos foi informado é um problema de demora na importação, já que o fármaco é fabricado na Índia”, salienta a enfermeira.

A denúncia foi feita ao Semanário por um leitor que preferiu não se identificar e que, por conta da falta do medicamento que precisa ser ingerido diariamente, já sofre com o medo da pausa no tratamento. O jovem de 23 anos, contraiu o vírus há um e durante todo o período, ininterruptamente faz uso de um medicamento denominado “3 em 1”. “Desde que comecei o acompanhamento médico, nunca fiquei sem os remédios. Mas sei o quanto é perigoso ficar dias sem tomar e assim, posso baixar minha imunidade, o que não é bom”, comenta.

Mais de seis mil comprimidos

Em Bento, somente para receber o tratamento com o medicamente “3 em 1”, disponibilizado pelo SUS, estão 200 pessoas, o que significa mais de seis mil comprimidos. Desde as que foram infectadas recentemente pelo vírus HIV, quanto as que controlam a doença há dois anos, desde que o medicamente começou a ser distribuído pelo Sistema.

O jovem que denunciou a falta dos medicamentos lembra que quando foi pegar os comprimidos para o mês de junho surgiu uma dúvida. “O que nos mantêm realmente vivos são os medicamentos. Isso é o que proporciona uma sobrevida melhor. Se eu chego a ficar sem, como vou saber se o tratamento realmente está dando certo e se isso não irá me prejudicar futuramente”, comenta.
O secretário da Saúde do município, Diogo Siqueira, reforça a preocupação com a medicamentação dos usuários de Bento e região. “Não é somente na nossa cidade que falta o remédio e vale salientar que se pudéssemos faríamos algo para contornar a situação. Até porque precisamos de seis mil comprimidos e recebemos apenas dois mil”, observa.

“Os pacientes não precisam ter pânico”

A médica infectologista, Flávia Casagranda, que trabalha diretamente no SAE/CTA de Bento garante que não é possível repassar os efeitos aos pacientes sem a medicação por alguns dias, pois o período é muito curto e incomum de acontecer no Sistema. “Na rotina de atendimentos aos pacientes com HIV/Aids, por situações de efeitos adversos às medicações, os pacientes precisam ficar alguns dias sem a medicação antirretroviral, sem que isso provoque falha terapêutica ou aumento na incidência de infecções oportunistas. Isso não significa que o enfermo, por opção, possa fazer uso irregular da medicação antirretroviral”, salienta a médica.

Além disso, Flávia garante que não é necessário ter medo, pois com pouco tempo de interrupção do tratamento não haverá riscos à saúde das mais de 200 pessoas que fazem acompanhamento no SAE. “O ideal é que não haja falhas no uso da terapia ARV, mas não é motivo para pânico dos pacientes, pois a disponibilização dos medicamentos será breve. Caso contrário, conversaremos com todos os assistidos pelo programa e explicaremos como agir”, garante a médica infectologista.

O convívio com a doença

O jovem que expôs a falta de medicamentos no SAE/CTA de Bento Gonçalves é morador da Capital do Vinho há quase quatro anos. Veio da fronteira do Rio Grande do Sul com o Uruguai e há apenas um mês contou à mãe, que ainda mora na cidade natal, que sofre com a doença. O convívio com o vírus HIV, segundo ele, não é fácil. Principalmente quando o assunto é preconceito. “Ninguém sabe que sou soropositivo. Tenho medo de contar e as pessoas me julgarem, principalmente porque ainda há muitas duvidas sobre o assunto”, comenta.

O psiquiátra Aldo Migliavacca explica que é comum o doente viver um luto quando descobre sobre a doença. “Ele vive as fases e, realmente, pode desenvolver a depressão e até pensar em suicídio, pois é muito complicado saber que terá uma doença como a Aids para a vida toda”, observa o médico.