Em vigor desde abril do ano passado, a chamada “Lei das Domésticas”, que estende a essa classe profissional os direitos trabalhistas garantidos aos demais empregados em outros setores. Os beneficiados pela lei são os maiores de 18 anos que trabalham para uma pessoa ou uma família em ambiente residencial, o que inclui faxineiras, lavadeiras, babás, cozinheiras, caseiros, jardineiros e motoristas. Os méritos da nova lei são indiscutíveis, mas ela também é um bom pretexto para provocar uma discussão sobre a legislação trabalhista brasileira como um todo. Independente disto, a partir da manhã, quem não legalizar seu empregado doméstico estará sujeito a multa.

São evidentes os efeitos positivos da Lei das Domésticas, no sentido de uma equalização de direitos entre estes trabalhadores e os demais funcionários. Não parece razoável privar os empregados domésticos de FGTS, seguro-desemprego e salário-família – para ficar em apenas três dos direitos que são garantidos pela nova lei (alguns dos quais ainda dependentes de uma regulamentação) e que vêm somar-se a outros que já existiam, como férias, 13.º salário, carteira assinada, folga semanal e integração à Previdência Social. Assim, a Lei das Domésticas corrige distorções que já vêm de décadas.

No entanto, parte das dúvidas comuns, tanto entre patrões quanto entre empregados, revela o risco de um engessamento desnecessário de uma relação em que o trabalhador doméstico é tratado com uma proximidade tal que praticamente não se observa em outros tipos de relacionamentos entre patrão e empregado. Costumes como almoçar na casa dos patrões, viajar com eles ou acompanhá-los em eventos culturais passam a ter um status nebuloso. O caso dos trabalhadores domésticos mostra que, na verdade, a legislação trabalhista brasileira não atende às especificidades de cada função, criando um modelo praticamente único e forçando a realidade, que é multifacetada, a se encaixar nos padrões legais.

A simples experiência mostra que a relação entre uma família e o empregado, no caso dos empregados domésticos, é totalmente diferente daquela existente entre uma empresa que busca o lucro e um funcionário contratado por ela; e a Lei das Domésticas, para atingir o objetivo – louvável, repita-se – de conseguir mais direitos para essa classe profissional, optou pelo caminho mais fácil ao desconsiderar essas pecularidades em vez de buscar uma solução que fosse a melhor, não apenas para os empregados, mas também para os patrões. Se a burocracia já dificulta a vida de uma empresa que pode contar com profissionais especializados para cuidar das suas contas, desatar o nó dos encargos trabalhistas é ainda mais difícil para uma família sem experiência no assunto. Aparentemente, isso também não foi levado em consideração pelos autores da lei.

Quando a natureza única de cada ocupação humana é ignorada, em detrimento de uma ânsia de legalismo e burocratização, surgem situações como as que agora serão enfrentadas por trabalhadores domésticos e seus patrões, mas que não são exclusividade dessa categoria. Os legisladores precisam estar atentos a essa diversidade para que o mercado de trabalho brasileiro se torne mais dinâmico e menos engessado.