Texto de Vitória Lovat
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Quando eu tinha 15 anos já conseguia me imaginar no futuro: 30 anos, solteira em um apartamento cheio de gatos. Pouco importava em qual cidade seria ou qual profissão eu teria, a única certeza que pairava na minha mente adolescente era sobre a companhia de quantos gatos o espaço comportasse. Na verdade, acredito que o amor pelos bichanos foi uma das poucas coisas que não mudou desde a adolescência.

É que essa certeza eu sempre tive, eles são os melhores companheiros. Gatos são seres superiores, indiferentes a qualquer coisa considerada inútil e interessados no que realmente importa: comida, um bom lugar para dormir, solzinho do meio-dia e cafuné atrás da orelha. Eles não vão te incomodar, não vão querer passear, não precisam de banho e só querem o mínimo: água, comida e um pouquinho de amor. Não vou compará-los aos cães, aqueles pidões de comida ao lado da mesa.

Os gatos são independentes, corajosos e atrás daqueles olhos misteriosos deve ter muita sabedoria animal. Eu já vi especialistas afirmarem que os gatos é que escolhem os seus donos, por isso são mais propícios a fugir do que os cães. Eles têm vontade própria, se essa família não é boa o suficiente para eles, talvez a da rua de baixo seja. Eles são os donos do mundo, os sabichões que não entram em qualquer furada, rápidos e com características físicas de quem sobrevive na selva.

Minha gata tem 16 anos. Cometi a infelicidade de dar o nome dela de Pitchula, era na época das garrafinhas de refrigerante para crianças, lembra? Mereço desconto, quando se tem 7 anos, muitos gostos ainda não foram aprimorados. Coitada, aposto que guarda ressentimentos até hoje. Meu pai, que não ousou contestar a minha escolha infeliz, até hoje não a chama pelo nome, vai ser sempre a Mima. Acho que ela fica confusa. Deve ser ruim ter dois nomes, eu ainda estou aprendendo a lidar com Vitória Maria.

Não sei como é a vida ao chegar em casa e não ter uma bola de pelos desdenhosa pra apertar. Vivo com pelos na roupa e nem dou bola pra rinite alérgica. Os espirros e a coceira valem todo o amor. Minha mãe fica furiosa. Minhas mãos vivem arranhadas e doídas, mas é outra coisa que pouco importa. Quando a Pitchula se enfurece com meus apertões e brincadeiras frustradas, ela não hesita em cravar as unhas e dentes em mim e só para quando tem vontade, parece que é a hora que ela diz “ah é, humana? Você quer brincar, então vou te mostrar como os felinos brincam”.

Fico triste quando alguma cicatriz some, parece que enquanto eu tenho as mãos marcadas me sinto mais perto dela. Exibo com orgulho os arranhões e já vou falando sobre como ela é parecida comigo (brava) e que ela vai viver mil anos. Eu espero, na verdade, que ela viva isso mesmo. Não quero ver o estrago na família quando ela partir desta pra melhor. Dias atrás cogitei a hipótese de empalhar a gata. É, eu não sei bem como é lidar com a morte e se ela estiver ali, pelo menos, fisicamente, pode ser um consolo, não? Não. Minha família repudiou a ideia. E eu também não teria coragem.

Ter um cachorro é ter um filho. Ter um gato é ter um irmão. O gato não depende você para viver, se ele vive ao seu lado é porque é bom estar ali. Então, minha gente, se um bichano o escolheu para dividir a vida é porque tem alguma coisa em você que o atraiu. Pessoa de sorte.